A Fiat não está exatamente em uma posição confortável. Na verdade, poucas montadoras, se é que alguma, estão. É por isso que a maior parte delas estuda, secreta ou publicamente, se juntar a outras e unir forças. O próprio Sergio Marchionne, CEO mundial da Fiat, disse que nenhuma fábrica de carros conseguirá ter lucros com uma produção mundial inferior a 5,5 milhões ou 6 milhões de unidades. Para garantir volumes, a empresa quer se aproveitar de associações e uma oportunidade de ouro surgiu com a crise financeira mundial. A empresa italiana sempre quis participar do mercado norte-americano, ainda o maior do mundo. Que melhor oportunidade para isso haveria do que uma aliança com um fabricante dos EUA? Nenhuma que nos ocorra. E o tal fabricante é a Chrysler.
Estas empresas têm linhas de produtos complementares e a Fiat tem o tipo de tecnologia que interessa à Chrysler: como produzir carros pequenos, leves e econômicos. A Fiat também tem o cara certo para o serviço: Cledorvino Belini, CEO da Fiat no Brasil.
Belini conduz a Fiat desde 2004, ou seja, em cinco dos sete anos de liderança da empresa no mercado nacional. Além disso, é o primeiro brasileiro a presidir a unidade brasileira, o que mostra que ele já ajudava a preparar a liderança antes de cuidar pessoalmente dela. Agilidade em decisões e desenvolvimento de produtos, gerenciamento eficiente de fornecedores, carros que oferecem boa relação custo/benefício e uma produção enxuta são algumas das qualidades da marca por aqui. Como a Chrysler precisa de uma receita parecida para se recuperar, e Belini conta com a confiança de Marchionne, nós devemos ter muitas notícias a respeito dele nos próximos meses.
No que se refere exclusivamente à Fiat e à Chrysler, a imprensa vem se referindo a uma aliança entre as duas, mas o que se criou, a bem da verdade, é uma nova companhia para dirigir Chrysler, Dodge e Jeep. E ela ficará sob o comando da Fiat, já que Bob Nardelli e Tom LaSorda, que cuidavam dela, estão saindo de seus cargos. Nardelli será consultor da Cerberus, empresa que tinha ações da Chrysler e tentou reerguê-la sem sucesso depois de comprá-la da Daimler. LaSorda se aposentará.
A Chrysler não conseguiu evitar o Capítulo 11, que vem sendo chamado de falência, mas não é em nada diferente do que conhecemos por concordata. Alguns dos credores da empresa não aceitaram renegociar as dívidas, feitiço que virou contra o feiticeiro. Agora a empresa tem proteção legal e não terá mais de negociar nada, só dizer o que pode ou não fazer. Aos credores, caberá apenas aceitar.
Apesar de isso parecer interessante para a Chrysler, não é. O maior bem que a empresa tem, a confiança dos clientes, pode cair a níveis ameaçadores por medo, aí sim, de uma eventual falência. É por isso que Barack Obama em pessoa disse que os carros da Chrysler são garantidos pelo governo norte-americano.
A produção de carros da Chrysler nos EUA vai ser interrompida na segunda que vem, dia 4 de maio, e será retomada quando toda a reestruturação da Chrysler estiver pronta, o que deve levar até 60 dias. Uma parte importante dessa reestruturação, de todo modo, já foi divulgada: 55% da empresa será dos funcionários, reunidos por meio da Veba (Voluntary Employee Beneficiary Association), 10% do governo dos EUA e do Canadá e 20% da Fiat. Os outros 15% só irão para a marca italiana se ela cumprir três requisitos:
* 5% se ela conceder à Chrysler um carro que atinja 17 km/l, para ser feito nos EUA (o Fiat 500, já confirmado);
* 5% se ela levar aos EUA uma família de motores altamente eficientes (serão os motores FIRE, os mesmos usados pela Fiat no Brasil, no Mille e no Palio) e;
* 5% se ela vender os carros da Chrysler em outros mercados aos quais a marca norte-americana não tem acesso, ou tem acesso restrito.
Este é um passo de que a Fiat já está tomando conta. Unidades da picape Dodge Dakota foram flagradas em Betim pelo blog Autos Segredos. Como a Fiat não produz picapes, este é o produto certo para vender aqui no Brasil, desde que com o motor certo.
Se a Fiat conseguir reduzir as dívidas da Chrysler com o governo norte-americano para US$ 3 bilhões ou menos, ela poderá comprar mais 16% de ações da empresa de 1º de janeiro de 2013 a 30 de junho de 2016, o que deixará a empresa com 51% das ações com direito a voto da Chrysler. De todo modo, a Fiat ficará limitada a uma participação de 49% enquanto todas as dívidas com o governo dos EUA não tiverem sido pagas.
Além disso, todas as operações financeiras da Chrysler serão conduzidas pela GMAC (isso mesmo, GM), o que vai permitir que quem ainda tem emprego nos EUA financie seu modelo Chrysler, Dodge ou Jeep. Esperemos que Fiat e Chrysler, juntas, consigam não só manter o número de empregos atual, mas ampliá-lo.
Fonte: Chrysler